terça-feira, 4 de novembro de 2014

Os perigos da acumulação compulsiva

Caracterizada pelo acúmulo de objetos e animais, ela pode causar sérios danos para quem sofre da doença e também para aqueles que dividem o mesmo lar
Doença é mais recorrente e sintomas são diferentes na terceira idadeA acumulação compulsiva é caracterizada como uma desordem psíquica, na qual o indivíduo portador apresenta um padrão exagerado de coleta e armazenamento de diversos itens, em geral, sem utilidade prática, como papéis, panfletos, jornais, lixo, restos de alimentos, embalagens utilizadas, resíduos etc.
Para identificar quem sofre dessa doença devemos analisar as atitudes do paciente. Se ele possuir um grande volume de coisas sem utilidade, intensa dificuldade de se desvincular desses objetos e baixa percepção do quanto sua situação é prejudicial à sua própria saúde e aos demais, é um forte candidato a ser um acumulador compulsivo. “Normalmente, as casas dos acumuladores tendem a ser abarrotadas, desorganizadas e disfuncionais, com prejuízo da qualidade de vida dos acometidos e dos familiares que moram no local”, explica a psiquiatra do Einstein, Marcia Morikawa.
Ainda segundo a especialista, também há os acumuladores de animais. São aqueles que recolhem bichos de forma seriada, sem se atentar às condições de higiene e cuidados dos mesmos e sem questionar a viabilidade de mantê-los em suas casas. “Esses acumuladores, na maioria das vezes, colocam a saúde dos animais e dos ocupantes da casa em risco por não conseguirem cuidar dos mesmos de forma adequada (castração, limpeza de fezes e alimentos e cuidados com parasitoses e doenças). Em muitos casos são encontrados até animais mortos entre os pertences da família”, conta Marcia.
Um acumulador não pode ser confundido com um colecionador, já que este seleciona objetos específicos para sua aquisição e manutenção e, em geral, tem apego aos itens colecionados, mas pode utilizá-los para a troca ou para a venda sem sofrimento psíquico desproporcional. Por sua vez, o acumulador não apresenta esta seletividade. Ao coletar objetos não há uma linha de raciocínio lógica sobre o motivo daquela escolha ou de sua necessidade. “Alguns estudos apontam para uma provável semelhança entre os pacientes com acumulação compulsiva e os pacientes com transtorno de impulso (jogo patológico, cleptomania, compras compulsivas e aquisição excessiva de itens gratuitos) havendo indícios de dificuldades no processo de tomada de decisões, particularmente quando há a necessidade de optar pelo descarte ou manutenção do item a ser possuído”, diz a psiquiatra.
O diagnóstico da acumulação compulsiva é realizado, na grande maioria dos casos, pelo médico de família (que tem acesso ao lar por outros meios e não pela procura espontânea do paciente, uma vez que ele não apresenta crítica de seu transtorno) ou pelo médico psiquiatra, que é procurado pelos familiares do paciente, visto que há grande disfuncionalidade do comportamento. É importante que o médico faça o diagnóstico correto para indicar o tratamento adequado e tentar minimizar o aumento do acúmulo de objetos/animais, minimizando os riscos para o paciente, tornando sua vida mais funcional e diminuindo seu sofrimento.
Estudos epidemiológicos encontraram a prevalência de dois homens para cada mulher acometida pelo Transtorno de Acumulação Compulsiva. Sabe-se também que os pacientes iniciam esse comportamento na infância e adolescência, com progressão do acúmulo ao longo da vida e consequente aumento do volume de itens guardados, pois quando pequenos ainda possuem baixa autonomia para comprar e reunir objetos. O início dos sintomas na terceira idade está relacionado a transtornos mentais orgânicos e demências.
De acordo com Marcia, o objetivo do tratamento para acumuladores é tentar melhorar a apresentação sintomática sem ter que retirar o paciente do meio em que vive, exceto em condições de extremo risco ou incapacidade. A estratégia trabalhada com o paciente é a de redução de danos, muito utilizada em tratamentos para dependentes químicos, que pode demorar meses a anos para ter eficácia nos casos de acumuladores. Porém, ela causa menos sofrimento do que a extirpação repentina dos pertences acumulados.
O uso de medicamentos serotonérgicos e o uso de terapia cognitivo comportamental têm sua importância, mas infelizmente os resultados são inferiores quando comparados aos pacientes com acumulação sem Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). Quando identificada uma comorbidade psiquiátrica o tratamento do transtorno é imprescindível, sendo os mais frequentes: transtorno depressivo, do impulso, de ansiedade, de personalidade, psicótico, demências, fobia social e TDAH.
A acumulação pode piorar com o tempo, pois é maior a chance do volume de itens aumentarem, causando impacto na funcionalidade do ambiente e na vida das pessoas que habitam o local. “Um estudo recente de GJ Patronek, que avaliou acumuladores de animais, quantifica que 78% viviam em condições sanitárias extremamente precárias e gravemente amontoados. Em 84% dos casos, o excesso de objetos e animais prejudicava o deslocamento das pessoas pelos ambientes e 71% deles inibiam o acesso a outros cômodos da casa. Por representar um problema de saúde individual e até pública, com prevalência de 2 a 5 % da população, devemos estar atentos à identificação e ao tratamento correto destes indivíduos”, conclui a psiquiatra do Einstein.
Fonte Dra. Marcia Morikawa, psiquiatra


Publicado em 07/04/2014

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